A Procuradoria-Geral da República (PGR) protocolou nesta segunda-feira (23) denúncias contra mais 54 pessoas por crimes relacionados aos atos de 8 de janeiro, por ocasião das invasões ao Palácio do Planalto, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Os denunciados foram detidos no acampamento em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, e deverão responder por incitação ao crime equiparada pela animosidade das Forças Armadas contra os Poderes Constitucionais (artigo 286, parágrafo único) e associação criminosa (artigo 288, caput), ambos previstos no Código Penal. Há ainda o pedido para que as condenações considerem o chamado concurso material previsto no artigo 69 do mesmo Código, ou seja, os crimes devem ser considerados de forma autônoma e as penas somadas.
Essa é a terceira leva de denúncias apresentadas pela PGR contra participantes dos atos registrados há 15 dias. Ao todo, já foram apresentadas ações penais contra 98 pessoas. No caso desta segunda-feira, os 54 já passaram por audiência de custódia, quando tiveram as prisões preventivas decretadas, estando atualmente em unidades do sistema prisional do Distrito Federal.
As denúncias são assinadas pelo coordenador do Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos, Carlos Frederico Santos. Nas petições, o subprocurador-geral da República apresenta resumo da sequência de acontecimentos até a formação do acampamento onde, conforme pontuou, “havia uma evidente estrutura a garantir perenidade, estabilidade e permanência” dos manifestantes que defendiam a tomada do poder.
A denúncia reproduz imagens e mensagens apontadas pelos investigadores como elementos de prova da existência de uma situação de estabilidade e permanência da associação formada por centenas de pessoas que acamparam em frente à unidade do Exército. De acordo com a denúncia, o acampamento funcionava como uma espécie de vila, com local para refeições, feira, transporte, atendimento médico, sala para teatro de fantoches, massoterapia, carregamento de aparelhos e até assistência religiosa.
Frentes de investigação – As denúncias afirmam que os fatos ocorridos em 8 de janeiro estão sendo apurados pelo MPF em quatro núcleos: executores materiais, autores intelectuais e instigadores, financiadores e agentes públicos que se omitiram. Frisa ainda que, em respeito à lei penal, cada participante deve ser responsabilizado conforme “a modalidade de participação na empreitada criminosa e na exata medida de sua culpabilidade”.
Nas denúncias – assim como fez nas ações penais já propostas ao STF em relação ao caso – Carlos Federico Santos explica porque não é possível denunciar os envolvidos também por terrorismo. Ele reproduz trechos da Lei 13.260/2016, aprovada pelo Congresso Nacional, frisando que o terrorismo deve ser caracterizado em condutas tomadas por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião. “Não faz parte dos tipos penais o cometimento de crimes, por mais graves que possam ser, por razões políticas”, destaca, completando que não se fazem presentes nas condutas praticadas as elementares legais.
O subprocurador-geral deixa claro que não se trata de reduzir a gravidade dos fatos de 8 de janeiro de 2023, mas de respeitar a “garantia fundamental prevista no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição da República”. Segundo o dispositivo, também expresso no Código Penal (artigo 1º) “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Conforme o MPF, trata-se “de direito individual de todos os cidadãos e contra o qual o Estado não pode avançar”.
Prisões preventivas – Na quota, documento que acompanha a denúncia, o MPF requer substituição da prisão preventiva por medidas cautelares. Essas medidas incluem a proibição de acesso a redes sociais, contato com os demais investigados e a qualquer estabelecimento militar e imediações com distância mínima de 500 metros. O pedido está baseado no fato de que as penas máximas estabelecidas para os dois crimes pelos quais os denunciados poderão responder (se o STF acatar o pedido) não ultrapassam 4 anos de reclusão, condição estabelecida no Código de Processo Penal (artigo 313 – I) para a imposição da prisão preventiva.
Além disso, no documento, o MPF afirma que uma vez desfeito totalmente o acampamento e adotadas as cautelares sugeridas, os denunciados não terão, isoladamente, capacidade de comprometer a ordem pública, a instrução criminal ou mesmo de colocar em risco a aplicação da lei penal. Dessa forma, também estariam afastadas as hipóteses para a decretação de prisão preventiva, previstas no artigo 312 do Código de Processo Penal.
Pedidos – Além de pedir a condenação dos 54 pelos dois crimes, o MPF apresenta novos pedidos de medidas para a continuidade das investigações, além de requerer que as testemunhas arroladas sejam ouvidas em blocos de 30 denúncias. A medida decorre do grande número de envolvidos e tem o propósito de agilizar os próximos passos.
A denúncia do MPF não representa a condenação dos envolvidos. Caberá à Justiça julgar se aceita os pedidos. Em caso de recebimentos, os denunciados passarão à condição de réus.